01. THE SIDE

Os dias se passaram velozmente para o Trovão, que via cada vez mais o seu ano terminar. Por algum motivo a escola parecia mais calma do que nunca. Os alunos mais problemáticos que costumavam questionar sua força já não se faziam tão presentes quanto antes, pareciam estar se poupando para algo maior. O tal "Ensino Médio" que veria. Sabiam o quão dificil poderia ser entrar em uma das escolas, e, bem, era perda de tempo ser o rei por dois meses, quando pode se preparar para três anos pela frente.

O que isso significava para Nobu? tédio. Muito tédio e puxação de saco. A parte boa era o fato de que constantemente recebia pequenos agrados dos primeiranistas, e com agrados eu quero dizer "retirar a força" coisas que lhe interessavam, como por exemplo revistas da Jump e lanches que pareciam realmente gostosos. Rain? vivia na entrada do carrinho de lanche, recolhendo o que chamava de "Imposto anti-queda", um valor simbólico de 100 Ienes daquele que não ia com a cara. (que passava todo o dia na frente da escola, no horário de intervalo. O mais engraçado? desde que Hina dera um discurso há dois anos atrás sobre respeitar o homem que entregava o lanche para os estudantes, todos passaram a respeitar o velho do Lanche. Apenas depois fora descoberto que aquele era o pai do próprio Hina)

Enfim. Era dezembro, dia 2 de Dezembro. O ultimo dia de aula. Impressionantemente Nobu não havia encontrado um substituto, o que fazia com segundanistas e primeiranistas começassem a se organizar em novas agremiações. O silêncio pairava pela escola. Era bem cedo, coisa de 6h30 da manhã. Ultimo dia de aula, correto!? E lá estava, sozinho Nobu dentro da sala, com os pés apoiados numa mesa onde diversas pichações eram possíveis de ser lidas. Aparentemente as mesas eram passadas de escola em escola, e pelo jeito aquela já era a terceira passagem. O garoto jurou ter lido "Himekawa, 1989" escrito na lateral da mesa, por mais que por cima um pênis estivesse desenhado de forma grosseira.

Até que alguém entrou na sala. Um rapaz de longos cabelos pretos desgrenhados, enrolados. Usava um par de óculos de sol pretos, como se fosse a coisa mais descolada do mundo. Vestia uma regata azulada onde se lia escrito "REI DA PESCA - ABERTO DAS 08H ÀS 21H" e com uma grande tilápia dourada desenhada logo abaixo. O rapaz caminhou até a janela, ao lado de Nobu, encostado de costas para a janela, ocupando a visão lateral do Trovão


Último dia de aula, huh? -- Ele comentou, como se fosse intimo do rapaz. Seu sotaque puxava para os moradores de Chubu. Quase um caipira na forma de falar, aquilo era inegável

O rapaz ao ouvir as palavras do desbocado Nobu franziu o cenho, apoiando o pé esquerdo na mesa onde o estudante estava, e então empurrou-a sutilmente com o pé, de forma com que o Trovão não pudesse momentaneamente se apoiar na mesma, e logo disse, deixando escapar um curto riso -- Todo o dia é um aprendizado. É um ditado, sabia? Tem coisas que apenas a dor ensina. Bom, todo o dia é um aprendizado para sujeitos como você. E se ficar falando muito, eu mesmo serei seu professor, seu pirralho -- Dizia, num tom orgulhoso e firme. Retirou do bolso de sua calça então um papel velho e amassado, arremessando contra a cabeça de Nobu

-- Eu disse para eles que você era fraco como uma porta, mas me encheram a porra do saco. Se for homem, apareça pra esses lados, ok? Eu até te explicaria, mas você é muito desbocado, e...bem...Eu tenho de trabalhar. Sabe como é, sustentar a sua mãe não é barato -- E então olhou para a janela, rumo à sua moto que estava na parte debaixo. Desceu suas mãos até o bolso, colocando-as ali. Caminhou até a porta, e então virou sua cabeça para trás -- Alguma pergunta? -- E sorriu

No papel era possível ler em letras garrafais "RUA MIYAMURA KAZEKISHI N322. BATER DUAS VEZES NO PORTÃO DE METAL. PALAVRA CHAVE : EU PERDI O MEU CACHORRO, VOCÊ O VIU?"

-- Eu não tenho nada pra falar pro faz-tudo de gangue alheia. Quando eu quiser alguma coisa com você, eu mando algum capacho meu pra deixar as coisas na mesma posição. -- Eu falava com um tom sarcástico com um fundo de raiva. O retardado tem sorte que eu to com sono demais pra me importar em brigar com um velho pobre metido a Diógenes. -- "Mas Rua Miyamura Kazekishi N322, huh? Eu já vi muitas dessas e não tem como isso não ser uma carta de desafio. É melhor eu reunir os meus depois da aula e ir pra lá. " -- Eu pensava. Uma última briga com minha gangue pra encerrar minha carreira no ginasial era tudo que eu poderia pedir. Minha expressão não tardava a se transformar em um sorriso malicioso. --

Antes mesmo que o rapaz pudesse ser ouvido pelo homem, ele apenas ergueu a mão fazendo um "V" com os dedos e então abrindo os braços como quem estala os ombros, e gritando em um tom que ecoou por todo o segundo andar

-- FODA-SE!

E então simplesmente desapareceu da vista de Nobu. quem era aquele homem, e por que ele estava ali? bom, aquilo não era muito importante para alguem como Nobu, que ainda tinha muito o que fazer naquele dia.

Seu dia seguiu da forma mais normal o possível : A rotina de logo antes da hora do lanche ir até a cozinha tomar um café e conversar com as pessoas ali. Seguida pela coleta de dinheiro, e por fim fingir que as aulas eram importantes. Às 13h estava dispensado da escola, e como de costume fora para casa.

Em casa tudo normal. Sua mãe havia saído para trabalhar, e só estava ele ali. Almoçou o resto da janta do dia anterior, e teve o resto da tarde para praticar algo que já estava colocando em dia : O seu jab. Nobu era de fato um autodidata, vendo no máximo alguns vídeos no youtube sobre boxe, mas a questão das guardas não era algo que fazia muito nexo. Nobu era mais forte do que técnico, sem dúvidas. Foram pelo menos duas horas dando murros nas paredes para poder praticar, num ponto onde sua mão já não ficava mais dolorida, afinal, fazia aquilo há um certo tempo. O resto da tarde? correndo atrás de seu cachorro pela casa para treinar sua esquiva, e...quando bem reparou já era por volta das 17h.

Seu celular logo tocou, e pode ver a mensagem de seu colega, Rain.

[The Powerain 17h22] Você também recebeu o papel?
[The Powerain 17h22] Eu recebi na aula. quase perdi no meio do dinheiro que peguei no intervalo.
[The Powerain 17h22] Oe, Nobu, me responde! eu sei que você tá online, maldito
[The Powerain 17h23] NOBU!! OEEE!!
[The Powerain 17h23] Não me faça ir na sua casa, yaro.

[The Powerain 17h25] Te perguntei nada,
[The Powerain 17h25] Eu sei que ela tá no trabalho.
[The Powerain 17h25] Pensei em passar lá. Será que ela iria gostar de eu acompanhar ela pra casa?

Ele claramente parecia mais focado na irmã de Nobu do que de fato no seu amigo. Tanto é que demorou um pouco para responder sobre a "Galera"

[The Powerain 17h28] Que galera, Nobu? o Yama tá trabalhando. O Mukishi tá cuidando da vó dele. Só temos nós dois mesmos. E isso se você me convencer a ir

A manha típica do Rain era assustadora. Ele fingia não querer ir, mas aparentemente iria, de qualquer jeito. Nobu fitou o papel por alguns segundos, se perguntando que tipo de coisa encontraria por ali. Por que estavam atrás deles dois? era algo tão importante? era impossível não ligar aquilo ao futuro do rapaz na escola que tinha pela frente.

Nobu se arrumou rapidamente, colocando a camisa velha branca, a calça preta larga do uniforme da escola e a jaqueta vermelha, que naquele dia específico parecia até mais cheirosa. Sua mãe teria cuidado da jaqueta do rapaz? aquilo era assustador. A velha raramente cuidava das roupas do filho, por dizer se tratar de uma obrigação do seu filho. Enfim, quando era 17h33 o rapaz se via amarrando os cadarços do tênis velho e furado, cujo a sola já começava a esburacar. Desceu as escadas e passou na cozinha para comer algo, e então sentiu o celular vibrar.

[The Powerain enviou uma foto] E na foto podia ver Rain no quintal da casa dele, brincando com o cachorro. O cachorro fora comprado para ser a proteção da casa, mas aparentemente era muito dado, num ponto em que até mesmo com alguem pulando o portão ele parecia não querer atacar, e sim apenas brincar.

O rapaz então se manteve abaixado fazendo carinho no seu cachorro, e comentou para ele -- Mochi-chan, ataca -- E pela primeira vez em um grande tempo Nobu viu seu cachorro se levantando como o bulldogue que era, olhando feio para Nobu e fazendo menção de atacar. Era assustador como Rain era bom com animais. O cachorro quase mordeu ele, chegando até mesmo a abrir a boca, como um mini-hipopótamo, e na hora da mordida Rain comentou

-- Deixa quieto, Mochi-chan. Boa. Vai pra casinha, vai.

E então ele se ergueu num salto, colocando suas mãos no bolso e bocejando por duas vezes seguidas, começando a caminhar ao lado de Nobu em total silêncio. Quando cruzaram a rua Rain retirou o celular do bolso, e arrastou o dedo para o lado, começando a gravar um audio

-- Koneko-chan, hoje não vou poder ir te buscar no trabalho, tá? Mas não fica triste. Eu volto de noite, e eu acho que vou acabar passando na sua casa. Cê faz aquele doce que eu gosto? Beijos.

Até ali tudo normal, certo? não. Nobu percebeu o olhar de pura malícia no canto do olho de Rain, e o sorrisinho afiado que começava a despontar, seguido de um "Heh" como quem diz "Otário". Rain então virou-se para o amigo e comentou

-- No-bu-chan, vamo rápido, então? -- E piscou. Será que...?