Hyoki Rokuro - Capítulo 10

-- Igor! Como é bom te ver! -- O garoto falava depois de alguns segundos como se recobrasse a consciência. Estar no Velvet Room era de certa maneira confortante demais. Ele sentia que estava deitado em uma cama a todos os momentos... Ou é porque ele realmente estava? O garoto levantou-se e sorriu para Igor, levantando as mãos para o alto como quem agradecia os céus -- Você acredita que o que você falou pra mim realmente aconteceu? Você não estava mentindo pra mim, foi realmente uma luz pra mim. Muito obrigado pela força, amigo. -- O garoto respirou fundo e sentou-se novamente. Ele sorriu para Igor cruzando os braços, mas teve de levantar a dúvida. -- Eu só ainda não tenho certeza do que eram aqueles monstros...

-- Monstros...sim, é assim que eles podem parecer.De fato. -- Igor acariciava o próprio queixo com sua mão direito enquanto dizia isso, seu tom era arranhado como sempre, mas dessa vez parecia indicar extremo interesse no que ouvia.Como um cientista que ouvisse uma hipótese muito interessante. -- Mas eles também são sombras das pessoas...onde houverem pessoas eles estarão e ainda assim a maioria das pessoas completam sua vida sem nunca se encontrar com um...então se alegre, Hyo.É possível que você nunca mais tenha que enfrentar um em sua vida.

-- Pera, que? Eles são feitos de pessoas? -- Ele põe a mão no seu queixo. Nesse momento, ele não pode deixar de imaginar um daqueles monstros com o cabelo do Jun, vestindo luvas de boxe. Uma leve risada apareceu em seu rosto -- Mas... Existem bilhões de pessoas, por que a gente nunca ouviu falar desses bichos antes? Não me parece muito crível. Ainda mais que esse poder com certeza vai trazer mais coisas assim pra minha vida, eu, um intelectual, vi JoJo. -- Ele encostava-se nas costas da sua poltrona. Por algum motivo, ele sentia que aquilo poderia ser o começo de algo recorrente, será? Afinal,
como ele havia aprendido na sua vida, coisas ruins atraem coisas ruins, a não ser que algo quebre o ciclo.

-- "Feitos de pessoas"...Entendo, sim, em certo sentido pode se dizer isso, entendo. -- Igor repetia seu gesto como se estivesse incrivelmente entretido pela resposta de Hyoki. -- Ora, mas você já ouviu sim.Você só nunca acreditou até agora...mas não é surpresa.Eles não podem existir sem pessoas e ainda não são coisas que possam existir com pessoas...pra dizer de um jeito simples.São criaturas que normalmente não existem, mas que ocasionalmente podem vir a existir durante um tempo, por isso as chances de encontrar uma são extremamente baixas. -- Explicava em um tom tranquilo, fazendo pausas aqui e ali e gesticulando com sua mão.Finalmente fazia uma pausa maior e dizia em uma voz mais séria, além de um pouco mais baixa: -- Mas lhe alerto de uma coisa...enquanto você desejar continuar com sua vida normalmente, as chances de um re-encontro com eles são esguias, mas se você desejar por um...tenha certeza que isso vai vir a acontecer, mais cedo ou mais tarde.

-- Eu não pretendo encontrar eles de novo. Por mais que esses poderes sejam maravilhosos... Sinto que podem ser perigosos até pra mim se não usar eles de um bom modo. Mas... -- Hyo pensou em si mesmo quando era criança. Assustado, debilitado por um incidente que não foi sua culpa. Naquele momento, seu corpo se juntou em uma angústia e suas mãos se fecharam, tremendo com nervoso -- Se alguém que não pudesse se defender encontrasse um deles... Eu daria tudo para estar lá. O desespero de se sentir incapaz é um sentimento horrível, e se eu pudesse, faria com que ninguém mais sentisse isso. Eles são visíveis pra todo mundo, não é? A Satomi viu... Mas não se lembra deles.

-- Eles morreriam na maioria dos casos, isso é verdade.Não..."eles morrem na maioria dos casos" é o jeito mais certo de dizer.Embora se eles se lembram disso ou não depois do que aconteceu quando eles sobrevivem...isso depende muito da pessoa. -- Igor confirmava o pensamento de Hyo em um tom pensativo. -- Mas se tornar um "herói" como você diz é algo que exigiria muito do acaso desse mundo. -- O velho juntava suas mãos com os dedos entrelaçados, apoiando os cotovelos na mesa. -- Mas vamos para o tópico principal. -- Desfazendo essa posição, ele apontava seu longo dedo para um objeto particular na mesa de cedro: a presa de "animal" que Hyo tinha usado antes. -- Esse é o contrato com o seu persona, a criatura que você é capaz de invocar.Saiba que ele é a unica coisa que você pode usar pra manifestá-lo e caso você o perca é uma tarefa extremamente difícil encontrar um substituto.

-- É bom saber que eu não vou invocar a Amaterasu se cortar meu dedo no papel, sem querer. Mas tudo bem, vou guardar com carinho!-- Hyo segura a presa daquela fera com força ao pegá-la da mesa.
Ainda parecia que tinha sido recém arrancada da boca do predador. Pelo jeito, aquilo era realmente algo sem explicação. Eles não existiam com um porquê. Igor se esquivou de todas as vezes que ele perguntou, então não deve ser algo que ele possa responder. Eles, talvez, só existiam. Assim como Deus que muitos acreditam, talvez até em contraste a Ele. Ele encostou-se novamente nas costas da cadeira após pegar a presa, sentindo-se sonolento -- Acho que era só isso, não é?

-- E tenha cuidado em quando usar seu poder, o sangue que sai do seu corpo pra formar seu persona não é um efeito especial...Se você usar ele de mais em pouco tempo pode realmente morrer por falta de sangue. -- Explicava com um tom sério. -- Se isso você causar, nos encontraremos novamente.A Velvet Room estará sempre aberta. -- Igor dizia. Hyo não precisava de algo mais claro pra saber que eram palavras de despedida.Seus olhos se fechavam lentamente, e quando se abriam se via na cama da cabana dos pais de Jun.Podia ver seu amigo dormindo na cama a alguns metros ao lado.A forte luz penetrando as frestas da cortina indicava que já era alguma hora no meio da manhã.

-- Mais cinco minutos, mãe... -- Apesar de, pelo que diria a lógica, ele estaria com os olhos abertos até então, não era o que se aplicava. Ao sentir as luzes, seus olhos conseguiram abrir só um pouco, o bastante para que pudesse ter uma visão embaçada que aos poucos foi melhorando do local. Era a boa e velha cabana. Jun dormindo do outro lado dizia que não aconteceu nada durante a noite. Com bem menos esforço do que o de costume, Hyo levantou-se e partiu para a cozinha, de onde pegaria seu lanche para partir para a sala da TV. -- "Eu tenho que pegar aquele crossover de Date With x Kill Bill que vai passar na TV hoje antes de irmos pra praia"

-- "O Jun provavelmente riria muito se visse isso"-- Libertando boa parte da sua criança interior, que já não fica lá muito bem escondida, Hyo seguia as poses e fazia os efeitos sonoros com a sua boca na medida que o desenho ia passando. Ele sempre acho que era velho demais, e que já tinha passado da idade de ver coisas assim, mas era estranhamento divertido e ele não queria parar. Francamente, esse programa era até normal, se pudesse comparar com as outras coisas que ele acompanhava. Afinal, macacos que ficam com raiva a ponto de ficarem loiros não são a coisa mais adulta do mundo

--Conforme o anime continuava, Hyo se via surpreendentemente envolvido com os personagens e o enredo e drama que exibiam uma profundidade maior do que esperava.Enquanto estava completamente imerso no segundo episódio que passava seguido na TV, Jun chegava na sala. -- Bom dia, flor do dia...Isso é Gekigangar 3? -- Perguntava entusiasmado.

Pessoas no Recinto:

-- Por alguns segundos congelado no susto, ele dava um sorriso sem graça. Mas ele sabia que Jun se sentia, no fundo, do mesmo jeito que ele. Seus lábios se abriam lentamente, ele engoliu a seco para poder falar, mas finalmente soltou as palavras tão importantes -- EM MINHA DEFESA, EU, UM INTELECTUAL, PREFERIA EVANGELION MAS NÃO ESTAVA PASSANDO-- Ele simplesmente ignorava Jun, continuava acompanhando o anime com o maior fervor que conseguia.

-- Hmpf, você diz isso porque é incapaz de apreciar um verdadeiro clássico como Gekigangar 3, facilmente o anime mais importante da indústria. -- Jun dizia se juntando à empolgação.Em meio a GEKIGAN BEAMS e GEKIGAN PUNCHs que eram soltados no volume máximo da TV e acompanhados por gritos de entusiasmo dos dois garotos.Mas isso logo atraia um som assustador pelo corredor. -- Que merda vocês tão gritando no meio da manhã? -- Uma pergunta com sede sangue mas quase inaudível comparada ao barulho da TV vinha da figura ameaçadora de uma Satomi de pijama extremamente irritada da porta da sala.

Pessoas no Recinto:

-- FICA QUIETA E ACOMPANHA A GENTE, É IMPORTANTE! -- Por mais que aquele fosse uma medida desesperada, ele imaginou que poderia ser a única coisa que os livrasse de começar o dia das reclamações de Satomi. Ela já era bem irritada normalmente, acordar com dois marmanjos gritando com anime não iria ajudar para o seu bom humor -- OS MONSTROS ESTÃO OBRIGANDO A GENTE!

-- De que merda você ta falando...meu deus vocês tão gritando com um desenho de criança. -- Satomi parecia não sabia saber se gritava em fúria ou se só ficava extremamente decepcionada, talvez pelo peso da decisão ou pela circunstâncias de seu despertar, ela segurava sua testa parecendo estar com dor de cabeça. -- Não é só um desenho pra criança, é um drama sobre a própria humanidade.A sua geração deveria aprender a apreciar os clássicos, Satomi. -- Jun respondia, 100% sério.Sua meia-irmã não sabia como responder a seriedade dele e ficava sem palavras por alguns segundos até retrucar irritada. -- Você só é um ano mais velho!

-- As crianças de hoje em dia não sabem apreciar os mais velhos e sua arte, Jun. -- Colocava a mão no ombro de Jun, com toda seriedade possível, ele balançava a cabeça enquanto olhava para Satomi com um olhar de quem havia sido desapontado-- Nós achávamos que você era diferente, menina, mas é como as outras -- Ele batia no ombro de Jun para que ele o acompanhasse, e agora os dois balançavam a cabeça lateralmente em desaprovação.

-- A resposta incomum dos dois gerava uma atmosfera que não permitia que Satomi respondesse, apesar de sua irritação visível, ela parecia não saber reagir agora que tinha sido transformada no cara mau da situação apesar de não ter feito além do que era perfeitamente entendível.Um silencio estranho ocupava a sala por um tempo, exceto pela TV que exibia um dialogo entre o protagonista e sua paixão Aquamarine que tinha acabado de se sacrificar para derrotar um monstro e estava a beira da morte. -- AQUAAAAAAAAAAAAA -- O grito ecoava pela televisão. -- V-Vocês já tomaram café? -- A garota desviava o assunto com uma voz constrangida.

-- Eu já, mas aceito um round 2. Afinal de contas, nós vamos pra praia já já, quem dirá o tempo que a gente vai ficar sem comer?-- Hyo fitou o quarto rapidamente. Ele lembrou que ainda tinha que se trocar para ir pra praia, o que o deixou um pouco menos animado para todo o trabalho que ia ter. Apesar de não ser muito fã de água salgada, Hyo gostava de molhar os seus pés e ficar assistindo da areia. E até isso, para alguém com suas debilitações, dava um grande trabalho. Ele cochichou no ouvido de Jun -- Algum dia a gente faz ela fazer as poses com a gente e formamos o Gekigangar 3. Ou a gente substitui ela por outra pessoa. Combinado?

-- Jun não respondia em voz alta, simplesmente confirmava com a cabeça com um olhar determinado antes de se voltar para responder. -- Eu ainda não, a gente podia fazer algo um pouco mais elaborado. -- Satomi não parecia conseguir recusar, vítima das circunstâncias. -- Pode ser.Vamos ver o que temos. -- Confirmava hesitante.O café da manhã não era exatamente super luxuoso, mas era algo bem diferente de algo improvisado também.Alguns peixes tinham sido grelhados, além de um grande arroz com omelete que fora preparado e decorado com o logo do 2icWars de ketchup por Jun.Sopa de Miso com um toque de Wasabi e alguns tempuras de batata formavam os pratos secundários.

--O garoto caía de boca. Apesar de já estar um tanto cheio, ele gostava bastante da comida dos dois. Apesar de que nunca concordariam, o garoto achava que eles faziam uma bela dupla. Hyo comu menos fervoroso do que da última vez, mas ainda assim competia com Jun. Naquele momento, ele lembrou do dia depois do primeiro treino de Jun na equipe de boxe, e sorriu -- Ei, Jun, lembra quando a gente tava naquele fast food depois do seu primeiro treino? Aquela foi a única vez que você comeu mais rápido do que eu. Eu nunca vi você tão animado com uma coisa. -- Apesar de conseguir engolir uma parte para tentar falar, aquilo ainda poderia ser considerado falar de boca cheia, e era um tanto difícil de entender. Apesar disso, ele sabia que Jun já conhecia o jeito dele de falar e entenderia oq ue ele disse, afinal, depois de tanto tempo como amigos, fica difícil não conhecer a pessoa tão bem.

--Ah, na verdade eu consigo comer muito mais rápido do que você, mas eu escondia esse fato pra não te magoar.Aquele foi um dia que escapou. -- Dizia com um sorriso confiante enquanto em contraste com sua fala, pegava tranquilamente um tempura com seu hashi e o levava até a boca, mastigando lentamente. -- Vocês competem em tudo mesmo? -- Satomi comentava chocada, enquanto trazia mais uma porção de arroz até sua boca. -- Nem em tudo, por exemplo, a gente não aposta corrida a uns 8 anos. -- Jun respondia.

-- ...Pesado... -- Hyo fingia-se chateado, olhando para baixo para mudar o clima. Depois ele voltou a sorrir, apontando para Jun-- Pelo menos eu não estou há anos sem ganhar no 2iC Wars.-- Hyo dava um leve sorriso de quem se sentia superior. Era claro que aquilo era mentira, mas Jun não tinha como provar. Ele olhou para Satomi, e balançou a cabeça-- Mas até eu não poder correr, eu ganhava dele todas as vezes.

-- Que mentira, você sempre tropeçava na primeira coisa possível e caía.As únicas vezes que você ganhou foi as que eu fui te ajudar a se levantar e você se aproveitou pra sair correndo na frente. -- O Yukimura respondia à provocação, com um tom levemente alterado.O café da manhã continuava pacificamente até um som familiar conquistar a atenção de Hyo.Era o começo do tão esperado especial da televisão que ele queria ver, Date With x Kill Bill. -- Não era disso ai que você tava falando? -- Jun perguntava.